terça-feira, 31 de março de 2009

Reciclagem Eletrônica


Reciclagem eletrônica

Abri minha caixa de e-mails, como faço diariamente. A princípio, não havia nada de anormal, dois e-mails novos na caixa de entrada: um do meu pai falando das saudades que sentia, outro da minha amiga que há tempos não via e tão pouco ouvia falar. O número dois me parece bastante razoável para uma caixa de entrada, mas o que me surpreendeu não foi ele, mas sim o 124 que indicava a quantidade de e-mails indesejáveis enviados diretamente para a pasta auto-explicativa “lixo eletrônico”.
Pensei seriamente em me conter com os dois e-mails pessoais, respondê-los e voltar à minha rotina diária. Mas o número 124 ficou ecoando na minha cabeça desde o primeiro momento em que apareceu no ecrã. Cliquei na pasta; a interminável lista tinha um pouco de tudo, muito de nada. Televisão a quarenta reais, apartamentos por trezentos, quartos por duzentos e muitos, além de muitos sites de relacionamentos gratuitos que anunciavam, perdão pela redundância, relacionamentos - não menos gratuitos.
Normalmente, passo reto por tais e-mails, deleto-os sem peso na consciência algum. Coloco logo no limpar caixa e resolvido, todos os comerciantes desaparecem da minha porta como que num passe de mágica. Não dessa vez, abri um por um. A intimidade no tratamento era impressionante, de querida ArteFacto à Factozinho. Sony, Searchrooms, HP, Voxcards, até mesmo o editor do Globo tinha notícias fresquinhas selecionadas especialmente para mim. Todos, meus amigos de longa data, eu era mesmo importante e não sabia. Percebia agora o quanto a Internet me conhecia, quanta gente sabia o meu nome e minhas preferências. Ia lembrando de quando havia deixado meu e-mail fosse para concorrer a alguma promoção imperdível cibernética, fosse para enviar um cartão àquela amiga que me havia do e-mail da caixa de entrada.
Ao passar um por um, a grande surpresa: alguns me interessavam. Como propostas de curso da universidade, aos quais muitas vezes não fui, por desconhecimento. E sempre argumentava o mesmo, “mas nem ouvi falar nisso, faltou divulgação”. Percebia que o quê faltava não era divulgação, pelo contrário, era provável que esta excedesse a ponto de não abrirmos mais o lixo eletrônico. Além dos cursos, vi que haviam e-mails pessoais também, amigos que mudaram de e-mail e ainda não os tinha na rede. Foi por pouco que também não acabaram no espaço vazio chamado “delete”.
A primeira impressão ao abrir tal terrível pasta é “invadiram a minha rede”, mas não, a rede não pode e não será nunca invadida, já que esta nunca fora fechada. E o que chamam de lixo, pode ser separado. A parte orgânica talvez vá direto pra debaixo da terra como os produtos “baratos, sensacionais e espetaculares” que não desejo consumir. Mas os amigos que mudaram de e-mails, sem culpa de nosso preconceito com o lixo não devem ter o mesmo trágico fim, muito menos os cursos dos quais nem ouvimos falar. Pode parecer mais fácil permanecer com o número dois, mais cômodo certamente será. Mas dos 124, com certeza esse dois pode ser elevado a uma potência que seria desperdiçada em um delete cheio de espaço vazio. Recicle, abra seu lixo!
Por ArteFacto

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